"Há momentos em que, mesmo aos olhos
serenos da razão, o mundo de nossa triste humanidade pode assumir o aspecto de
um inferno, (...)"
Edgar Alan Poe
Um amigo me repassou a história, testemunhada por ele, no metrô
paulistano: em plena hora do rush uma garota espirrou no vagão,
entre estações...um vazio abriu ao seu redor e as pessoas bronquearam enquanto
a menina gritava: "é rinite, gente, é rinite". Em tempos de
corona vírus, a situação é até normal. Há o medo natural do contágio.
A rotina foi interrompida, sem dúvida, e não sabemos a que grau ainda
será modificado nosso cotidiano. Mas não é uma situação nova, inédita .
Aos quase 60 anos, já passei por outras situações parecidas e sempre
surpreendentes...a de doenças causadas pelo vitorioso aedes aegypt, peste suina,
febre amarela etc. Todas elas, com exceção do H1N1, eu passei à
margem...nem da dengue, que ainda nos tocaia. Aliás, se nos desesperamos agora
é justamente porque temos certeza de que não estamos preparados para enfrentar
qualquer epidemia...não há qualquer tranquilidade de que poderemos enfrentar,
já que até as doenças que já enfrentamos (veja abaixo as que me lembro de minha
existência), ainda continuam fazendo vítimas e adquiriram o status de algo
existente, próximo e que que só D'us pode nos salvar.
A ditadura escondeu a epidemia de meningite |
No entanto, a lembrança mais antiga que tenho é da epidemia de
meningite, na década de 70, quando a doença grassou por São Paulo, com uma
letalidade de 12 a
15%, um absurdo nível que a "bondosa" ditadura militar primou em
menosprezar, ignorar e - caso acontecesse agora, certamente o Bozo a trataria
como fake news ou golpe da imprensa - tardar a dar
atendimento. Somente a mudança de plantão no Planalto, com a saída do
general Médici e a entrada do militar de mesma patente, Geisel, é que se tomou
alguma providência...isso, depois que a meningite passou por sua fase aguda e
passou a refrear as mortes, que nunca chegaram a ser estimadas, já que a
censura prevalecia e esse tipo de informação tinha severo controle.
Para se ver, o pânico e a falta de um sistema médico de prevenção e
atendimento na saúde fez com que se recorressem a meios profiláticos que beiram
ao charlatanismo: pedaços de cânfora colocados em saquinhos de pano e
pendurados como colares nos pescoços das pessoas. A orientação era a de se
respirar tendo a cânfora junto às narinas..na falta de outra coisa e contando
com a sorte...
Outras duas lembranças subsequentes se relacionam com vírus mas
não com seres humanos, mas me marcou a mente...uma delas é a do cancro cítrico,
também na malfadada década de 70, quando hectares e hectares de plantações de
cítricos foram derrubadas e queimadas para evitar a passagem do vírus...ou
também da peste suína africana (PSA), inserida no nossos porcos através da
vacinação contra a peste suína clássica (PSC)...os animais chegaram a ser
mortos aos milhares a marretadas, ou fuzilados por soldados do exército.
Até hoje, na internet, há autores que defendem que a infecção de nosso
rebanho suíno foi ato de sabotagem...
Cólera |
Cólera, causado pelo Vibrio
cholerae..desde a década de 90 até hoje a coisa está pegando, mas parece
que as autoridades se acostumaram com a coisa, atuando pontualmente e não mais
buscando erradicá-la... pegando pesando em alguns países vizinhos e nos estados
do norte brasileiro, onde a situação sanitária nunca chegou a um grau de
eficiência e perfeição. Por ser de regiões tradicionalmente não atendidas
por saneamento básico, atendimento médico e por vítimas pobres, nunca chamou
muito a atenção dos políticos...logo, ficou quase como doença crônica, natural
entre nós. Nem assusta mais.
O caso do sarampo, aparentemente, depois de ser uma presença
constante e provocadora de milhares de mortes há décadas, havia sido contida
pela vacinação em massa...no entanto, a crise venezuelana e a massa de refugiados
no Brasil nos trouxe novamente, nesses últimos anos o fantasma do vírus Measles
morbillivirus, altamente contagioso...também causou furor, principalmente entre
os direitistas que se divertiam em criticar o governo de Maduro, alimentando a
ideia de uma intervenção militar naquele país vizinho. O sarampo não se
transformou em algo pior porque o Brasil já tinha na agenda da saúde a
cobertura vacinal preventiva e eficiente.
Ah, o aedes... |
E como esquecer das doenças transmitidas pelo maldito aedes aegypti, como a dengue,
zica e chinkungunya? Um insetinho importado da África que desafia governos e
governos...e anualmente causa vítimas entre os homens, com previsão de aumento
em quase 350% de contaminados com a dengue em 2019 em relação ao ano passado,
ou seja, 450 mil doentes portadores do arbovírus até abril de 2019.
O paranóico dessa história é a acomodação das autoridades em
remediar a situação, tentando impedir que chegue a índices alarmantes... Para o aedes aegypti sobreviver basta sobreviver às nuvens
de veneno lançada sobre as populações nos bairros periféricos principalmente,
que os contém (além de matar todos os insetos que topam com a nuvem envenenada,
como as abelhas) para voltar no próximo verão. Apenas em duas situações
históricas foi vencido em batalhas: no início do século XX, que exigiu uma
mudança urbana significativa no Rio de Janeiro, quando houve uma remodelação
arquitetônica de toda a cidade e em várias capitais na década de 50...quando
houve adaptações estruturais que detiveram o desgraçado. Depois veio a
acomodação e a implantação da indústria da doença... O mosquito não resiste a
medidas preventivas.
A febre amarela ocupa um capítulo à parte, por ter sido sempre
tratada de forma oscilante, vezes com seriedade, vezes com desdém...a ponto até
de ter a sua vacina "fragmentada", ou dividida para enfrentar a
recente pandemia (isso sequer é aceito internacionalmente).
Acredito que tenha sido vitimado por alguma mutação do vírus H1N1,
a influenza, quando em 2009 ou 2010 houve um aumento dos casos...não houve
complicações e me livrei sem hospitalizações....
H1n1 |
Bom, o caso é que a atual situação com esse Corona Vírus não será diferente. Existe o
pânico, a histeria e a consequente acomodação das autoridades... Não podemos
esperar (esqueçam!) que o atual governo, com o presidente que temos, possa dar
conta de uma situação que deveria ser mais preventiva que curativa. A
china e a Itália, seguida de outros países partiram para a criação de cordões
sanitários, enquanto no nossa Brasil, os bisonhos governantes neoliberais
acreditam na etapa curativa, ao mesmo tempo que jogam na população a
responsabilidade em torno do contágio... Não há como acreditar na seriedade de
um governo cujo mandatário diz e se contradiz e menospreza a doença, como se
fosse algo distante e golpe da imprensa... Passaremos por essa epidemia
se mantivermos a solidariedade e a compaixão de nos cuidarmos, de evitarmos o
pânico e mantivermos nossa atenção voltada ao coletivo..a realidade é que
muitos ainda serão infectados, muitos manifestarão a doença e muitos morrerão.
A progressão é impressionantemente alta devido a alto contágio. A priori,
não temos na rede pública leitos suficientes para cuidar dos doente (mas,
quando tivemos?). Projeções indicam a existência de 4 mil contaminados no Brasil
e a projeção de 30 mil casos confirmados na região metropolitana de Sampa até o
final de abril. No Brasil, ainda não houve mortes (houve, em 17 de março, morreu a primeira vítima), mas nos países vizinhos
sim....
...jogam na população a responsabilidade em torno do contágio..O que há por detrás disso?
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